Fica difícil pra uma vaca sair do supermercado cheia de sacolas e pegar um micro-ônibus.
Mas eu subi. Passei pela catraca, paguei ao motorista que puxou meu rabo que ficou preso na porta. Sorrimos entrei chacoalhando e fui pro fundo onde parecia ter lugar.
Dei de cara com um bêbado que me disse sussurrando: -Vamu pra delagacia!
Voltei prum assento ao lado de um grandão, que não gostou muito, mas nos ajeitamos.
Lá atrás o cara continuava: -Pára na delegacia!
A cada vez que dizia isso, as pessoas olhavam pra trás. Metade delas eram crianças, com seus pais, todas um pouco assustadas.
O ônibus já não estava mais tão cheio e então o cara teve mais espaço e disse agora: -Devolve a menina!
Olhei pra trás e vi um grandalhão, eu já o tinha visto outras veses pelo bairro, com os olhos esbugalhados de terror, com uma menina de uns 6 anos agarrada nele, gritou em pânico: -Ele é meu pai!
O cara disse mais uma vez: -Devolve a menina!
Antes que terminasse a frase, tomou uma cotovelada de baixo pra cima, caiu sentado, e sem que precisasse muito esforço o pai encheu de socos a cara do cara.
Era uma parada. O cara desceu em silêncio. Virou-se para olhar o interior do ônibus. Levou a mão à boca ensanguentada. Alucinado continuou olhando pro nada quando o ônibus arrancou.
Fez se um herói.
As pessoas passavam pelo pai, cumprimentando. Uma disse que já tinha visto o cara o seguindo, outro que usava carteira especial. Ainda lembro daquele olhar... vidrado e sangrando. Sangue nos olhos.
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